Começa julgamento de Matteo Salvini por bloquear entrada de navio com migrantes na Itália

O julgamento contra o político italiano de extrema-direita Matteo Salvini, acusado de abuso de poder ao ter bloqueado ilegalmente no mar 147 migrantes em 2019, quando era ministro do Interior, começou no sábado (23) em Palermo, na Sicília. Os migrantes estavam a bordo de um navio da ONG espanhola Open Arms, a quem Salvini negou permissão para desembarcar na Itália, deixando-os presos no mar e colocando suas vidas em risco.
Entre as testemunhas listadas na ação está o ator americano Richard Gere, que visitou os migrantes a bordo enquanto esperavam na costa da Itália. Para Salvini, a presença do ator é um exemplo da falta de seriedade das acusações feitas contra ele.
“Vamos falar sobre Richard Gere. Você me diz o quão sério é um julgamento quando alguém vem de Hollywood para testemunhar sobre minha maldade”, questionou ele, falando aos repórteres após a primeira audiência no sábado.
Um dia antes, ele havia brincado que, se Gere fosse oficialmente nomeado testemunha, ele pediria um autógrafo para sua mãe.
Outras evidências a serem usadas contra Salvini incluem registros de comunicação de chamadas de emergência do navio da ONG e da Guarda Costeira italiana quando designaram o porto de Lampedusa como porto de desembarque, para determinar em que ponto e de que forma Salvini interveio.
Salvini negou repetidamente as acusações de sequestro, mas admitiu ter impedido o navio de atracar na Itália, dizendo que era seu dever como ministro do Interior.
Ele argumenta que, como o navio Open Arms tinha bandeira espanhola, os migrantes deveriam ter sido levados para a Espanha.
Sua advogada Giulia Bongiorno, que anteriormente representou Rafaelle Sollecito em seu julgamento com Amanda Knox pelo assassinato de Meredith Kercher, argumentou que o julgamento nem mesmo deveria ser realizado sob jurisdição italiana porque o navio é espanhol, e que um navio de bandeira espanhola não tem autoridade para atracar em um porto italiano sem permissão.
A audiência, de um processo iniciado em 15 de setembro e imediatamente adiado, foi um mero trâmite processual que durou menos de três horas, antes de o juiz Murgia anunciar que a próxima sessão acontecerá em 17 de dezembro. Se for considerado culpado, Salvini pode receber uma sentença máxima de 15 anos de prisão.
Política de ‘portas fechadas’ para migrantes
Salvini, de 48 anos, afirma que atuou pelo bem da Itália com sua política de “portas fechadas” para dissuadir os migrantes de embarcar nas costas africanas para uma travessia perigosa do Mediterrâneo.
Também alega que a decisão não foi tomada apenas por ele, e sim pelo governo, incluindo o primeiro-ministro da época, Giuseppe Conte.
A Liga alega que a Itália suporta uma carga injusta por ser o primeiro ponto de entrada na Europa para as pessoas procedentes do norte da África. Devem prestar depoimento a atual ministra do Interior, Luciana Lamorgese, e o ministro das Relações Exteriores, Luigi di Maio.
“O processo que desejavam a esquerda e os partidários da imigração ilegal começa: quanto custará aos cidadãos italianos?”, questionou Salvini. “Aqui está o tribunal da prisão de Palermo”, tuitou Salvini da sala de audiência.
Antes da sessão, o fundador e diretor da Open Arms, Oscar Camps, afirmou que o julgamento não tem motivações políticas. “Salvar pessoas não é um crime, e sim uma obrigação, não apenas dos capitães mas de todo o Estado”, declarou Camps à imprensa.
Desembarque de mais de 400 migrantes
O início do processo coincidiu com a chegada de 406 migrantes, resgatados em várias operações nas costas da Líbia pela ONG Sea Watch, ao porto siciliano de Pozzallo.
Durante seis dias, as autoridades italianas negaram a permissão de entrada em um porto seguro ao barco da organização espanhola, que ancorou diante da pequena ilha italiana de Lampedusa, ao sul da Sicília, enquanto pioravam as condições das pessoas a bordo.
Os migrantes desembarcaram graças a uma ordem emitida pela justiça siciliana após uma inspeção a bordo que confirmou a emergência sanitária e a superlotação dentro do navio.
O Senado da Itália aprovou no ano passado a suspensão da imunidade parlamentar a Salvini, o que abriu caminho para o julgamento. Um caso similar em que Salvini foi acusado de bloquear outros migrantes no mar de um barco da Guarda Costeira italiana foi rejeitado por um tribunal de Catânia no início do ano. (com dados de agências internacionais)