Abertura do Festival de Veneza conta com Almodóvar e Penélope Cruz e premia Roberto Benigni com Leão de Ouro

Uma dupla emblemática do cinema espanhol, Pedro Almodóvar e Penélope Cruz, marcou a abertura da 78ª edição do Festival de Cinema de Veneza nesta quarta-feira (1º), que este ano garante a presença de várias estrelas no tapete vermelho, apesar da pandemia. Já o ator, comediante e diretor italiano Roberto Benigni foi homenageado com o Leão de Ouro pelo conjunto de sua obra e fez um apelo ao presidente da Itália, Sergio Mattarella.
Almodóvar, que concorre ao Leão de Ouro junto com outros 20 filmes, abre a competição com “Mães Paralelas”, no qual aborda alguns de seus assuntos favoritos, como a maternidade e a família, mas também um argumento muito político: o da guerra civil espanhola e a ditadura franquista.
O cineasta espanhol, de 71 anos, que alcançou a fama mundial com a ousadia colorida de seus filmes e iniciou sua carreira internacional justamente no Festival de Veneza – no qual recebeu em 2019 o Leão de Ouro honorário – chegou ao Lido acompanhado por todo o elenco de seu filme, entre eles a atriz Penélope Cruz.
Com Milena Smit, Aitana Sánchez Gijón e Israel Elejalde, o filme narra a história de duas mulheres de gerações diferentes que vão ao mesmo hospital para dar à luz, uma experiência que acaba as unindo profundamente. Os relatos dessas mães solo, que buscam formar suas próprias famílias, são também um pretexto para falar de um passado incômodo, devido ao peso dos espanhóis desaparecidos.
Uma verdade pessoal e uma histórica
O filme aborda uma verdade pessoal e uma histórica e é protagonizado por “mães imperfeitas”, segundo explicou o próprio Almodóvar.
“Agora me interessam mais as mães imperfeitas, questionáveis, ou que enfrentam momentos muito difíceis”, confessou o cineasta.
“As mães (dos filmes anteriores) eram o exato oposto, eram inspiradas em minha própria mãe, figuras femininas de quando eu era jovem, quando era cercado de mulheres, minha mãe, as vizinhas, todas as mães onipotentes”, contou.
Com seu novo filme, o cineasta espanhol – famoso por “Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos” (1988) e “Tudo Sobre Minha Mãe” (1997), aborda um assunto ainda quente e que divide a Espanha: o dos “desaparecidos”.
“A memória histórica é uma questão pendente na sociedade espanhola. Tem uma dívida moral enorme com a família dos desaparecidos”, afirmou o cineasta em coletiva de imprensa após a primeira exibição. Uma dívida “com essas pessoas que estão enterradas de forma indigna”, destacou.
Mais de 100.000 vítimas do conflito (1936-1939) e da ditadura (1939-1975) ainda estão desaparecidas, algumas enterradas em fossas comuns, segundo estimam historiadores e associações de vítimas do franquismo, que pedem ajuda pública há décadas para encontrá-los.
Almodóvar, que desenvolveu o projeto do filme durante o confinamento pelo coronavírus em 2020 na Espanha, usa uma série de fotos em preto e branco e conclui com uma emocionante homenagem aos desaparecidos, com uma frase do escritor uruguaio Eduardo Galeano.
“Até que essa dívida com os desaparecidos seja paga, não podemos encerrar definitivamente tudo o que aconteceu na Guerra Civil”, insistiu.
Durante a ditadura, “nos lares espanhóis, na minha casa por exemplo, não se falava da guerra” porque “foi algo que traumatizou nossa sociedade” e quando chegou a democracia “a pergunta nunca foi feita”, resumiu.
O elenco do filme desfilou perante os fotógrafos no tapete vermelho pouco antes da cerimônia de inauguração na lendária Sala Grande do Palácio de Cinema, com a presença do presidente da República italiano, Sergio Mattarella.
Foi uma cerimônia sóbria, com pouco público e sem o tradicional jantar de gala por causa da pandemia, durante o qual o cineasta italiano Roberto Benigni, autor do inesquecível “A vida é bela”, recebeu o Leão de Ouro honorário por sua trajetória.
O prêmio foi entregue pela diretora Jane Campion, que destacou o talento cômico, esperançoso e sincero de Benigni, um dos artistas mais populares da Itália. “Neste momento difícil para diretores e para pessoas de todo o mundo, Roberto Benigni é necessário”, disse ela.
Ao receber a homenagem, Benigni dedicou a honraria à sua esposa, Nicoletta Braschi, com quem faz “tudo junto há 40 anos”.
“Só posso dedicar o Leão pela carreira a Nicoletta: é dela. Eu me prendo na cauda, as asas são dela, talento, mistério, charme e feminilidade. Você emana luz, amor à primeira vista, aliás visão eterna”, declarou o artista italiano.
Durante seu pronunciamento, Benigni ainda brincou dizendo que merece um “gatinho” em vez de um leão. “Não é uma emoção, é mais: é um sentimento de amor que sinto e que gostaria de retribuir 10 vezes”.
Por fim, ele pediu para Mattarella ficar no cargo por “mais alguns anos”, após o término de seu mandato. “Eu amo o Mattarella, gostaria de beijá-lo e abraça-lo”, disse Benigni, apelando para o presidente ficar no Palácio do Quirinale.
Com 68 anos, Benigni é conhecido pela versatilidade e já estrelou mais de 30 longas em sua carreira, dos quais o mais célebre é “A vida é bela”, também dirigido por ele e que lhe rende o Oscar de melhor intérprete masculino e melhor filme estrangeiro.
Na produção, o italiano dá vida ao judeu Guido, que usa sua imaginação para proteger seu filho dos horrores de um campo de concentração nazista.
Em seu trabalho mais recente no cinema, o ator interpreta “Geppetto” na adaptação de Matteo Garrone para o clássico infanto-juvenil “Pinóquio”.
O Festival de Veneza, que teve a cerimônia de abertura nesta quarta-feira acontecerá até o próximo dia 11 de setembro. (com dados de agências internacionais)